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Post{o} de Vigia

10.10.24

DALL·E 2024-10-10 14.48.13 - A cubist-style illus

O relativismo cultural é um tema que não pode ser tratado de modo polarizado, sob pena de deixar escapar as mais nucleares curvas da discussão. Em sobrevoo, o relativismo cultural é uma proposta pós-modernista que resulta do reconhecimento de que a colonização europeia do mundo deu origem a uma sensação de universalismo humano de forma abrangente, o que não corresponde à verdade, dado que a diversidade humana, embora possua verdadeiros universais culturais, tem matizes de tal ordem locais que impossibilitam a proposta de monismo cultural. Nesse sentido, o relativismo defende a necessidade de avaliar as culturas nos seus contextos e valores próprios. Esta ideia entra em choque com o primado liberal de que há valores que transcendem culturas e geografias, como os Direitos Humanos, direitos inerentes à dignidade que não podem ser desconsiderados em razão de localismos.

Essa questão ganha maior dimensão quando analisada nas nossas geografias ocidentais, ou seja, quando o relativismo cultural passa a ter de ser avaliado em razão de fluxos migratórios. Assim, o bom senso — categoria em desuso — diz-nos que os povos (i) devem ter o direito à sua memória e identidade étnica, cultural, religiosa, mesmo em contexto migratório; (ii) esses direitos não se sobrepõem ao ordenamento jurídico do país de chegada, que tem no topo os Direitos Humanos.

Ora, sucede que em razão da polarização e dos populismos de vária ordem, temos duas teses em confronto: a de que os migrantes devem abandonar as suas tradições por completo, adotando a cultura de chegada e remetendo as suas crenças religiosas para o âmago privado, e a de que qualquer alerta sobre choque cultural é uma cedência ao populismo de direita radical.

Esta polarização inquina o debate. Pior, inquina os processos de acolhimento dos migrantes; primeiro, porque os transforma em pessoas hipervigiadas, vistas como potenciais criminosos; segundo, porque, em sentido diverso, faz destes vítimas absolutas de um sistema capitalista hegemónico e opressor.

Porém, na realidade as coisas processam-se de formas muito mais complexas. Isto porque, de facto, os imigrantes são sujeitos a um sistema de exploração evidente, com sobrelotação habitacional e exploração laboral, seja por meio de serviços de transporte e entregas, como Glovo, Bolt e Uber Eats, o que fere a sua dignidade enquanto pessoas; e, ao mesmo tempo, não têm sido poucos os casos em que o relativismo cultural é posto em causa. Em Lisboa têm decorrido casos de assédio por parte de jovens motoristas da região do Indostão a passageiras; no Alentejo foram reportados casos de assédio por parte de trabalhadores agrícolas da mesma região a jovens e mulheres; e, em Benavente, foram denunciados casos de assédio a menores, entre os 9 e os 16 anos, no trajeto que liga o pavilhão da Casa do Povo, onde decorrem as aulas de Educação Física, e a Escola Duarte Lopes. Falamos, sempre, de pessoas do sexo masculino, entre os 20 e os 35 anos, que, estando sozinhos no país, oriundos de países onde os direitos das mulheres são comprimidos, agem de forma contrária à norma social e jurídica nacional.

Esta situação não pode ser considerada de forma polarizada nem populista, ou seja, não se deve olhar para os acontecimentos adotando o viés do “eles”, nem o da desculpabilização. A única forma de evitar estas situações é realizar uma integração coerente, continuada e plena, através de mecanismos públicos de introdução às normas sociais e jurídicas elementares, de aprendizado da língua, de envolvimento comunitário. Evidentemente que isso só pode ser feito com políticas migratórias bem desenhadas, o que não acontece.

→ artigo no Sapo sobre a matéria : https://www.sapo.pt/opiniao/artigos/a-imigracao-e-o-relativismo-cultural-entram-no-cafe-central

02.10.24

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Benavente é formalmente instituída como localidade, através de carta de Foral, a 25 de março de 1200. Trata-se de uma das localidades mais antigas do país, com uma trajetória histórica e cultural importante, mas que não tem sido objeto de políticas ativas no plano da memória histórica e cultural.

A literatura especializada, de Maurice Halbwachs a Pierre Nora, afirma a importância da memória coletiva como marcador identitário de um povo, mesmo sabendo que as memórias são remexidas de modo a enfatizarem narrativas, as quais são, por sua vez, também basilares na identidade de um grupo que compõe o Estado. Com efeito, a ideia de «nação» é uma construção apressada, do século XIX, que por tal é frágil e precisa de memórias essenciais para se manter.

No caso de Benavente, atendendo ao seu histórico de longo-termo, o que surpreende é o vazio de uma política de memória. É verdade que a ideia de memória tem uma ressonância política e uma textura, em Portugal, ligada ao Estado Novo e à fabricação do país rural, de bons e comedidos costumes. É por isso que a memória benaventense foi e mantém-se formatada em torno da cultura campina e tauromáquica, concordante com o ideal do Estado Novo. Efetivamente, tal memória não se afasta da realidade. Pelo contrário, a memória campina e tauromáquica é nodal da cultura ribatejana e afigura-se património identitário essencial que vem sendo promovido.

O problema reside, em rigor, no esvaziamento de qualquer memória adicional. É difícil compreender por que motivo o Foral e as figuras do Mestre Pelágio e D. Sancho I não são exaltadas condignamente, por exemplo, através de uma estátua adequada, como Salvaterra de Magos possui a homenagear os falcoeiros. De igual, a própria Ordem de Avis, ligada à fundação de Benavente, e a Ordem Religiosa de Sant’Lago à qual pertencia o Fortim de Belmonte, ligada à fundação de Samora Correia, tal como figuras como a mulher Çamora, que seria familiar de D. Paio Peres Correia, bem como este, entre tantas outras, tais como o militar Pedro de Meneses, mereciam uma política de memória ativa. A própria memória da Igreja Matriz é difusa e pouco integrada, não como elemento estritamente religioso, mas como património cultural. 

Há, portanto, uma défice gigantesco em termos de memória histórica e cultural no Município de Benavente, que precisa ser colmatado, através das instituições municipais, como museu e outros espaços culturais, bem como por via da política pública de espaços edificados, como praças, rotundas e jardins, de modo a evitar que a identidade do município pareça esgotar-se na cultura campina.  

29.08.24

Várias são as cidades que estão a trocar as carruagens a cavalo por carruagens elétricas, acomodando a oferta turística ao bem-estar animal, em linha com uma nova consciência social e jurídica emergente. Há, contudo, uma questão que não está a ser colocada no seio de uma disputa cultural sobre o lugar dos animais na sociedade atual, que é a de saber o que se faz aos animais que deixam de ter uso económico. Há todo um lastro socioeconómico de criação de cavalos (e outros animais) que está associada ao desporto, ao turismo, a diversas atrações. Com o fim deste mercado, como ficam os animais? Será que quem os cria, com enorme despesa envolvida, o continuará a fazer? Não estaremos a colocar em risco a sobrevivência de espécies? 


A transição de carruagens a cavalo para carruagens elétricas em várias cidades é uma medida que, à primeira vista, parece atender à crescente demanda por práticas que respeitem o bem-estar animal e estejam em sintonia com uma nova consciência social e jurídica. Esta mudança reflete um avanço na perceção da sociedade sobre o tratamento dos animais, especialmente em contextos onde o turismo e o lazer envolvem o uso de animais de tração. No entanto, essa iniciativa também levanta questões importantes que precisam ser cuidadosamente consideradas e que, até agora, parecem ter recebido pouca atenção no debate público, fazendo uso de uma abordagem de proporcionalidade entre o objetivo a atingir e os meios envolvidos para esse fim. 

Uma das questões centrais é o destino dos animais que, com a eliminação das carruagens puxadas por cavalos, deixam de ter um papel económico claro. A história da domesticação dos cavalos está profundamente enraizada em atividades humanas como o transporte, o desporto e o entretenimento. Assim, a retirada desses animais dessas funções levanta a pergunta: o que acontecerá aos mesmos?

Com efeito, a perspetiva de manter e cuidar de um cavalo sem que ele desempenhe uma função lucrativa pode ser insustentável para muitos proprietários. Isso poderia/poderá levar a um aumento no abandono ou, no pior dos cenários, no abate desses animais, caso não sejam acautelados tais efeitos e procuradas soluções de mitigação. 

Além disso, há que se considerar a cadeia produtiva associada à criação de cavalos, que inclui desde criadores até veterinários e fabricantes de equipamentos específicos. Se a procura por cavalos diminuir drasticamente, muitos desses profissionais e negócios podem enfrentar dificuldades económicas significativas, o que, por sua vez, pode ter um impacto negativo nas economias locais e regionais dependentes desse setor.

Outra dimensão do problema é a possível ameaça à conservação de certas raças de cavalos que, tradicionalmente, são criadas para essas atividades. Sem uma procura constante, pode não haver incentivo económico para continuar a criação dessas raças, o que poderia colocar em risco a sua sobrevivência a longo prazo. 

Embora a medida esteja alinhada com uma nova consciência social e jurídica sobre o tratamento dos animais, ela não considera plenamente as consequências económicas, culturais e ambientais caso se alastre a regiões profundamente ligadas a tradições equestres, como o Ribatejo, onde cavalos e touros são parte integrante da identidade local, donde a mudança pode ter impactos devastadores para a economia e para o património cultural. 

Por fim, a questão de se criaremos reservas ou áreas protegidas para cavalos selvagens ou sem uso económico é algo que deve ser seriamente ponderado. Se a sociedade decidir que esses animais devem ser preservados independentemente de sua utilidade económica, isso exigirá a criação de políticas públicas específicas, investimentos em infraestrutura e talvez até a redefinição de certos espaços geográficos para acolher esses animais de forma digna e sustentável, o que tem custos que podem não ser realistas para autarquias ou para determinados Estados que lutam com constrangimentos orçamentais e a necessidade de atender ao Estado Social. 

Portanto, ao considerar a troca das carruagens a cavalo por carruagens elétricas, ou medidas mais abrangentes de supressão do uso animal, ou mesmo extinção de práticas como as tauromáquicas, é crucial que se faça uma avaliação abrangente dos impactos dessa mudança. A decisão deve ir além da preocupação com o bem-estar animal imediato e contemplar as consequências socioeconómicas e ambientais a longo prazo. Será que na tentativa de corrigir uma injustiça, poderemos inadvertidamente criar novos problemas, tão graves quanto aqueles que pretendemos solucionar?

15.05.24

Sucede que o tem, numa quantidade suficiente para dela extrair uma exposição permanente.

Todo o museu local é, em primeiro lugar, uma salvaguarda etnográfica das práticas e tradições culturais do seu povo, cumprindo um papel simultaneamente de recolha, salvaguarda e de fruição, da qual resultam processos educativos essenciais, junto das suas populações escolares e públicos diversos, que permitem encapsular e contar a memória histórica local. Nesse sentido, um museu como o de Benavente -- particularmente no contexto de remodelação -- deverá cumprir papéis concordantes com a museologia e museografia do século XXI, deixando de ser um espaço de depósito de objetos e de produção cultural residual. Quem me conhece sabe que há anos que defendo uma reconfiguração conceptual do Museu Municipal de Benavente (MMB), no sentido de o levar ao encontro das suas possibilidades, ultrapassando uma visão fortemente ideológica de aconchego de património. Numa realidade sociológica em profundas transformações, Benavente, enquanto sede de Concelho, deve ter um museu que projete devidamente a sua cultura e ao mesmo tempo seja capaz de diversificar a sua oferta cultural e científica.

Benavente encaminha-se, a passos largos, para deixar de ser uma realidade monocultural, isto é, uma região marcada por uma cultura única, para se afirmar, cada vez mais, como um local de encontro de múltiplas culturas. É fundamental que o Museu responda a essas transformações, desde logo oferecendo de forma robusta uma exposição permanente e devidamente curada sobre o seu património local, sendo visita obrigatória para as populações escolares. Em segundo lugar, precisa ser um espaço plural, capaz de dar conta das transformações sociais e culturais, respondendo com projetos concordantes.

Ora, no âmbito do seu espólio o MMB é portador de uma coleção considerável de arte africana, que se encontra armazenada por falta de estudo. Isto é um facto inconcebível, particularmente sabendo que essa arte foi oferecida por populares que estiveram em África, como colonos ou como combatentes. O processo de inventário e catalogação permanece - até onde sei - por fazer. Nesse sentido, essa coleção é parte da memória histórica local e deveria ser tratada como tal. A arte africana é um tesouro cultural de valor inestimável, não apenas pelo seu intrínseco valor estético, mas também pela sua importância histórica e antropológica. A manutenção desta coleção fora do alcance do público e da academia não só priva os visitantes do museu de uma experiência enriquecedora, como também impede que investigadores aprofundem o seu conhecimento sobre as tradições, crenças e práticas das diversas culturas africanas representadas nas peças.

Além disso, a preservação adequada e a exposição da arte africana podem contribuir para uma maior valorização e reconhecimento da diversidade cultural africana, promovendo o respeito e a compreensão intercultural. As obras de arte africanas muitas vezes carregam significados profundos, simbolismos e histórias que merecem ser estudados e compreendidos em toda a sua complexidade. É imperativo que no quadro da reforma do MMB sejam tomadas medidas concretas para reverter esta situação.

03.05.24

Devo reconhecer a minha incompreensão face à política da autarquia de Benavente em relação às sombras nos espaços públicos. Benavente é um Concelho inserido no distrito de Santarém, um distrito fortemente fustigado pelas ondas de calor desde a primavera até ao outono. Embora as temperaturas médias sejam de 30º nessa altura, não são raros os dias que chegam perto ou ultrapassam os 40º. No quadro da vila de Benavente, por exemplo, verifica-se uma incompreensível desatenção à importância das árvores no arrefecimento e melhoria da qualidade do ar. Isto torna-se mais gravoso nos parques infantis enquanto espaços de lazer destinados às crianças, que são absolutamente infrequentáveis durante a maior parte do dia durante todo o verão. A este cenário acresce (i) a situação dos equipamentos escolares, carentes de árvores e alternativas de sombras para as crianças e jovens, que realizam atividades exteriores em condições pouco salubres, (ii) o facto de várias ruas da vila carecerem de soluções arborizadas de modo a baixarem a temperatura e permitirem a circulação de pessoas.  A obra realizada na Praça da República, que visava a requalificação estética foi um evidente fracasso, retirando as sombras das árvores e substituindo por umas espécies de para-sol cónicos que não cumprem o efeito, nem ofereceram uma valorização estética. 

Vale referir que plantar árvores em ambientes urbanos tem uma série de benefícios cientificamente comprovados, não apenas em termos de baixar a temperatura, mas também na melhoria da qualidade do ar e da qualidade de vida dos residentes. Um estudo publicado em "Nature Communications" destaca que árvores em áreas urbanas ricas podem diminuir as temperaturas até 4º no sul da Europa. Outro estudo, publicado pela USDA Forest Service, mostra como árvores e arbustos urbanos contribuem significativamente para a remoção de poluentes atmosféricos, como ozónio, PM10, dióxido de nitrogénio, dióxido de enxofre e monóxido de carbono, melhorando a qualidade do ar nas cidades. De igual modo, espaços verdes e a presença de árvores em ambientes urbanos estão associados a benefícios significativos para a saúde mental e física, incluindo redução do stress, melhoria na saúde mental e incentivo à atividade física. De acordo com pesquisas publicadas na "Nature" e MDPI, pessoas que vivem perto de áreas verdes têm menos problemas de saúde mental, como depressão e ansiedade. Além disso, a proximidade a espaços verdes tem sido associada a melhores resultados de saúde cardiovascular e menor mortalidade geral. 

Há, portanto, razões de sobra (aliás, razões de sombra) para que exista uma política de espaços verdes e arborização no Concelho de Benavente, capaz de reduzir as temperaturas, facilitar a circulação de pessoas nas ruas, permitir o arrefecimento de habitações, propiciar o uso de equipamentos exteriores de lazer, e ao mesmo tempo oferecer uma imagem de “Concelho Verde”.  O projeto "Forest of Belfast" transformou a cidade ao plantar quase 200.000 árvores desde 1998, integrando espaços verdes em áreas urbanas e proporcionando numerosos benefícios ambientais e sociais. Caso paradigmático é o de Washington, com quase 2 milhões de árvores que contribuem para a redução da poluição e dos custos de energia. ​

14.04.24

Tendo já expresso a preocupação a quem direito, i.e., à direção do agrupamento escolar sem obtenção de qualquer retorno, e cumprido o dever de reforço da questão junto da mesma, faço uso do presente espaço para manifestar a minha preocupação com a ausência de espaços de sombra nas escolas de Benavente, para as atividades exteriores. Como é sabido, o Ribatejo é conhecido pelas suas altas temperaturas, o que torna as atividades ao ar livre um verdadeiro desafio, especialmente a partir do período vigente até ao fim do ano escolar.

Tenho reparado (nomeadamente no Centro Escolar) que as crianças apanham demasiado calor durante estas atividades (ainda que tenham chapéu, o que nem sempre acontece, pois não se verifica um reforço pedagógico por parte de quem tem essa incumbência), o que pode ser prejudicial para a sua saúde.

Assim, fiz questão de sugerir a colocação de redes de sombra nas áreas onde as atividades exteriores são realizadas. Estas redes são uma solução simples e eficaz para reduzir a exposição das crianças ao sol direto e fornecer sombra para que possam desfrutar das atividades ao ar livre de forma mais segura e confortável. Acredito que esta medida não só irá beneficiar a saúde e o bem-estar das crianças, mas também irá contribuir para a melhoria da qualidade das atividades ao ar livre que a escola oferece.

De igual modo, parece-me viável, o recurso a equipamentos como pavilhões municipais, espaços análogos, e de coletividades (veja-se o caso do Auditório Nossa Senhora da Paz) que por sua ligação à autarquia podem dispor dos mesmos para conforto das crianças e jovens do município, permitindo contornar este problema e, no caso, também as questões das dificuldades naturais durante o inverno.

11.09.23

Redigi a seguinte missiva destinada ao Presidente da Câmara de Benavente, em nome coletivo, a 11 de Setembro de 2023:

O coletivo de pais, encarregados de educação e familiares que frequentam o Complexo dos Camarinhais (e o mesmo se estende aos demais equipamentos desportivos municipais, seguramente) reconhecem que a Câmara Municipal de Benavente tem uma preocupação inequívoca com a prática desportiva e um compromisso com os clubes do município, os quais tudo fazem para representar com elevado espírito competitivo e de fair-play o mesmo nas mais variadas competições.Assim, considerando a importância de fomentar a presença de acompanhantes dos atletas e demais munícipes que pretendam apoiar os atletas que participam em treinos e provas nas instalações referidas, vimos solicitar a V. Exa. que sejam instaladas as prometidas coberturas das bancadas. Consideramos que tal comodidade trará enormes mais-valias tanto para todos aqueles que frequentam aquele equipamento desportivo, quanto para a imagem do município, mostrando uma evidente preocupação com as adversidades atmosféricas que enfrentam todos aqueles que ali se deslocam continuamente para acompanhar os mais diversos atletas.Cientes que tomará em consideração e consciência a relevância da questão,Subscrevemo-nos com os devidos cumprimentos,

12.09.21

Não estranhamente, os resultados são exatamente aqueles que avancei em privado a quem me pediu que tentasse um prognóstico. Mas não é isso o relevante. O que conta é que a abstenção permanece elevada. É verdade que há dificuldade de deslocação de alguns munícipes, mas isso não explica uma abstenção de 55,38%. Há, efetivamente, um abandono do direito-dever de voto, conquista da Democracia. O argumento da falta de opção político-partidária não é útil, pois não estavam em concorrência apenas 2 ou 3 partidos.

Quanto aos resultados propriamente ditos, há várias leituras. A primeira delas de âmbito nacional, com um desvio à Direita como sinalização à esquerda da necessidade de não dar eleições por garantidas e, bem assim, de um sentimento conservador crescente, em linha com o resto do Ocidente.

Ao nível microssistémico, ou seja, local propriamente dito, a CDU perde a sua maioria, fruto de um desgaste natural, de algum destanciamento face à população e, sobretudo, devido à ausência de soluções para problemas antigos como de saneamento, PDM, e mau cheiros (v.g. Coutada Velha) e problemas cíclicos como o crime. O PS perde um vereador, tanto por razões nacionais como fruto da instabilidade de longo-termo do partido. O PSD aproveita ambos os fatores, bem como a existência de uma candidatura e programa político mais sólido, para ganhar o vereador que o PS perdeu. O Chega, como expectável, ganhou um vereador nas suas primeiras autárquicas, em razão de problemas de criminalidade conhecidos e delimitados, bem como através de uma campanha de apelo ao enraizamento cultural.

10.09.21

A análise aos programas eleitorais que se segue não dispensa a consulta dos mesmos, uma vez que se pretende ser um relevo não-exaustivo das principais propostas.

(a ordem apresentada segue a cronologia do acesso aos mesmos, por caixa do correio, entrega em mãos ou consulta digital)

PSD – Embora tenha ficado em terceiro lugar nas últimas eleições autárquicas, o PSD apresenta um programa eleitoral sólido e coerente. Na área da EDUCAÇÃO destacam-se as propostas de reforço de bolsas de estudo, melhoria de soluções de transporte escolar, reforço da qualidade das refeições escolares e a construção de um ginásio na Escola Duarte Lopes. No âmbito da AÇÃO SOCIAL E SAÚDE, salienta-se a aposta em projetos de capacitação da população em diversas áreas como a cidadania e o ambiente, mas há que notar que a terminologia «reeducação» é infeliz, porquanto invoca os programas de reeducação dos regimes autoritários. Acresce a intenção de captação de novos médicos de família através de um plano de benefícios (não sabemos quais), a reabertura da extensão de saúde na Barrosa, Foros de Almada e Foros da Charneca e o projeto de cuidados paliativos. Na pasta de CIDADANIA E VOLUNTARIADO, destaca-se a implementação do Orçamento Participativo, o projeto de voluntariado porta-a-porta que visa colmatar as dificuldades de acesso a bens e serviços, a criação do balção social, os cheques-bebé de incentivo à natalidade. Em matéria de COMPETITIVIDADE E INVESTIMENTO verifica-se uma agenda mais ou menos expectável e em harmonia com a tipologia de ações noutras autarquias, desde o “ninho de empresas” à proximidade com o tecido empresarial. Relativamente à SEGURANÇA, destaca-se o regresso dos Vigilantes Noturnos, provavelmente uma figura similar ao Guarda-Noturno e a construção de um novo posto da GNR. Quanto ao TURISMO, é de reconhecer que o partido tem razão quando afirma que tem havido uma despreocupação do executivo com o turismo, fator que sabemos essencial para a promoção de muitos Concelhos no nosso país. Destaca-se a construção de um complexo aquático com piscinas exteriores (proposta que me parece pouco acertada se não em articulação com o Sorraia), a reabilitação do Centro Cultural de Benavente. No que se refere à JUVENTUDE, a proposta de estágios em empresas do Concelho parece interessante, mas poderá ser pouco exequível devido à limitação do tecido empresarial existente. Uma nota final para as VIAS PÚBLICAS, que são uma preocupação antiga das populações, nomeadamente a retirada dos camiões do centro de Samora Correia. Fica, contudo, uma dúvida sobre o que se entende por eliminar barreiras arquitetónicas. Por fim, no quadro das freguesias, o programa revela uma atenção particular em relação à Coutada Velha (saneamento, controlo de velocidade, rede de ciclovias, atendimento aos fregueses presencialmente), localidade que tem sido sucessivamente esquecida, com exceção do pagamento de IMI.  Em matéria da Junta de Freguesia uma derradeira nota para a CULTURA, onde se prevê a compilação da história oral e tradição, ideia que, de resto, já defendi diretamente junto do atual executivo.

CANDIDATURA INDEPENDENTE – Apesar de mais reduzido do que o programa apresentado pelo PSD, assume-se coerente e dialogante com o anterior, dando nota, assim, de uma consciência transversal das deficiências atuais. Destaca-se a descentralização das sessões de assembleia municipal, a efetivação do orçamento participativo, a criação de um programa de apoio ao arrendamento jovem, as preocupações com os centros urbanos e o tráfego, em especial de camiões, a construção de parques recreativos inseridos na natureza, ações de prevenção de incêndio e voluntariado de limpeza das florestas, a construção de um lar municipal em Benavente, de um centro de dia na Barrosa e de uma unidade de cuidados continuados em Samora, a proximidade às faculdades de medicina no sentido de captação de jovens médicos e o estabelecimento de parcerias com universidades, centros de formação e escolas secundárias, criação de percursos históricos. Fica uma dúvida sobre o que se pretende com a anulação das barreiras arquitetónicas num Concelho onde o planeamento urbanístico e paisagístico é particularmente deficiente.

CDU – Este serve, sobretudo, para efeitos de controlo da ação do futuro executivo, considerando a forte probabilidade do PCP (CDU aqui não tem representante do PEV) voltar a vencer as eleições. Trata-se de um programa extremamente detalhado, como se exige num executivo incumbente. No plano da AÇÃO SOCIAL E HABITAÇÃO, destaque para os projetos de cariz social ligados aos idosos e rede de creches, à requalificação das igrejas (o que contradiz o princípio da não proximidade às comunidades religiosas), o alargamento das parcerias com a APAV (o que demanda por maior divulgação, pois a informação não é pública nem se verifica qualquer campanha no sentido de sensibilização nesta matéria) e melhoria na gestão das hortas comunitárias, de cuja existência não tinha conhecimento. Em sede de EDUCAÇÃO destaque para a construção de um novo centro escolar em Samora Correia, a ampliação do centro de escolar das Areias, a implementação do ensino secundário em Samora Correia, alargamento das condições formativas na escola secundária de Benavente, entre outras iniciativas que visam reforço do trabalho já desenvolvido. Na área da SAÚDE levar a cabo diligências de reforço da oferta de cuidados de saúde e fixação de médicos. Na área do DESPORTO destacam-se inúmeras propostas, algumas bastante ambiciosas, exequíveis apenas com fundos europeus, como a construção de dois polidesportivos, um em Santo Estêvão, outro em Belo Jardim, e iniciativas de requalificação de vários complexos desportivos. Na pasta da CULTURA, destaco a construção de um Arquivo Histórico Municipal na Biblioteca Municipal de Benavente, a conclusão da requalificação do Museu Municipal de Benavente (iniciativa fundamental, mas que carece de um planeamento administrativo que coloco sérias dúvidas à concretização), inúmeras iniciativas de requalificação dos espaços associativos e culturais do Concelho. Apesar das inúmeras propostas, permanece em falta um plano de mapeamento de tradições e disponibilização ao público, proposta que apresentei ao executivo há 3 anos. No plano do ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO, URBANISMO e DESENVOLVIMENTO ECONÓMICO, destaca-se a exigência junto do governo da construção do aeroporto no campo de tiro da força aérea, requalificação das zonas industriais de Samora e Benavente, baixar o IMI e a requalificação dos centos históricos. No plano do TURISMO, onde a gestão da CDU tem sido manifestamente deficitária, pretendem implementar a construção de cerca de 90 km de percursos pedestres, ciclovias e equestres, incentivar a construção de unidades hoteleiras (muito pouco viável sem um projeto turístico voltado para o rio, como provam vários municípios do país).

CHEGA – O programa é apresentado com uma mensagem que fala na perda da identidade da população, o que parece pouco concordante com a realidade, num Concelho onde se vive em torno das tradições. É possível que se trate de uma reação à presença migratória. Em relação à ECONOMIA E EMPREGO, o Chega pretende reforçar o atrativo das zonas industriais, dinamizando a oferta de emprego. A fixação de empresas é uma medida transversal aos vários partidos. Em relação à SEGURANÇA, defende um policiamento de maior proximidade. Em referência ao programa “Escola Segura” não fica muito claro, por problemas gramaticais, qual o objetivo do partido. O aumento de efetivos e a melhoria das instalações da GNR é uma necessidade real que o Chega também elenca no seu programa. Em matéria ambiental, destaca-se a interessante proposta de criação de um departamento de limpeza de terrenos, para prevenção de incêndios, que disponibilize aos munícipes esse serviço a custos reduzidos, bem como o desejo de reativação da unidade de bombeiros de St.º Estêvão. Em matéria de TRANSPORTES E ARRUAMENTOS, o partido pretende retirar o trânsito de pesados da N118, em linha com o protocolado em 2013. Defende ainda um estudo de requalificação do estacionamento no centro das freguesias que fomente o comércio tradicional e beneficie os residentes. Na pasta da QUALIDADE DE VIDA, o Chega defende a exigência junto das Águas do Ribatejo e da EDP na melhoria dos serviços, situações que vêm sendo uma reclamação da população há mais de uma década, um aproveitamento estratégico dos rios em favor do lazer, incentivo ao comércio tradicional. Em matéria de EDUCAÇÃO, embora o partido defina a educação “como um elemento base essencial do desenvolvimento”, o seu programa não traz nada de concreto ou de novo. Quanto à SAÚDE, destaca-se a reivindicação de mais médicos e enfermeiros nos centros de saúde, a requalificação da USF de Samora Correia, e articular com as escolas programas de ajuda em comportamentos aditivos e saúde sexual e reprodutiva (aqui seria fundamental saber se o partido estaria em linha com a legislação ou se pretenderia promover uma doutrinação anti-aborto e de reconversão da orientação sexual). Em matéria de CULTURA E TRADIÇÕES, o partido mantém a defesa das tradições locais e do monismo cultural. Em sede de ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO, destaque para intenção de harmonização arquitetónica e paisagística. Na AÇÃO SOCIAL, destaca-se a atividade física para idosos e o convívio sénior e “justiça na atribuição da habitação social, auto responsabilizando quem beneficia destas ações sociais, para que não se criem hábitos de subsidiodependência”. Nesta matéria a proposta não é inconstitucional nem controvertida, não fulanizando. Na área da JUVENTUDE E DESPORTO, o partido alinha as propostas com os demais partidos, em matéria de promoção da atividade física, voluntariado jovem, e apoio às coletividades. Por fim no AMBIENTE, o Chega apresenta as suas propostas mais relevantes, ao defender ações de sensibilização junto da população e dos estabelecimentos de comércio, de recolha de resíduos junto dos estabelecimentos de restauração, aumento do número de ilhas ecológicas, preparação do estaleiro municipal para receção de resíduos empresariais.

PS – partido com forte implementação eleitoral nas eleições legislativas, tem sido a segunda maior força política em Benavente, sem, contudo, conseguir significativo número de vereadores, em virtude das querelas internas partidárias que desmobilizam a confiança dos eleitores. Esta situação está vertida no programa do partido, pouco densificado, onde são apresentadas linhas-mestras de uma eventual orientação estratégica, mas que não concretiza de forma eficaz um programa de atuação. Destaque para a preocupação na preservação do património sem esquecer os novos conteúdos culturais. Releva a preocupação com o fomento do tecido empresarial, em linha com os demais partidos, e com a necessidade promoção do atrativo turístico.

Em suma, a CDU é a força política – por óbvias razões de continuidade – que apresenta o programa político mais detalhado e coerente, explicitando de forma concreta as medidas a implementar. Apresenta, por tal razão, uma dimensão megalómana quando avaliamos o programa face ao que tem sido implementado em concreto. Apesar da tradição de voto na CDU e da sua captura eleitoral por diversas vias, a verdade é que esta é a força política que se revela mais preparada para o desempenho das funções. Em segundo lugar encontramos o PSD, uma força política com um tecido eleitoral residual, por força de uma tradição esquerdista no Concelho, mas que apresenta um programa coerente e claro. O PS, segunda força eleitoral, somente poderá contar com resultados positivos em função de uma implementação social maior, ficando muito aquém, com um programa pobre e revelador de um partido em permanente ebulição interna. Nesse sentido, embora pobre, o partido Chega consegue superiorizar-se ao PS na construção de um programa eleitoral, suplantado, contudo, pela Candidatura Independente, um pouco mais sólida nas suas propostas.

Vale notar, por fim, que nenhum dos partidos apresenta uma atenção ao multiculturalismo presente no tecido social do Concelho, enquanto fator potencial de dinamização das atividades culturais, à exceção, por ventura, do Chega, mas como preocupação a contrario.

Cólofon

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