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No editorial do Público, escreve Ana Sá Lopes que "O improvável Joe Biden será, ao que tudo indica, o próximo Presidente dos Estados Unidos da América". Tenho pouca simpatia pelos wishful thinkings na análise política. Por vezes demais este tipo de raciocínio descambou em prognósticos desligados da realidade. Um deles foi, precisamente, o das eleições norte-americanas, quando ninguém dava a vitória de Trump como possível. É o problema de se pensar o mundo a partir do «lugar de fala» elitista - ele só existe na sua bolha e não tem aderência à realidade, muito mais multivocal. Recomenda-se prudência. Em primeiro lugar porque, como a jornalista pontua, Trump pretende adiar as eleições. Esta é uma estratégia, obviamente, que visa a perpetuação no poder pelo tempo que lhe for "democraticamente" impossível. Além disso, apesar dos efeitos económicos da covid-19, a verdade é que a América não pode ser pensada a partir dos Estados urbanos, mas antes precisa ser vista a partir da sua dimensão multipolarizada, uma vez que os Estados do midwest e do eleitorado "redneck" tende a reagir de forma agressiva em tempos de crise económica, voltando-se ainda mais para os seus valores ultraconservadores. Ora, Trump continua a ser a pessoa que melhor representa esse manual de valores que vão do racismo, ao ultranacionalismo, passando pelo machismo e pelo conservadorismo religioso.
Quanto à possibilidade de Michelle Obama surgir como número 2 de Biden, compreendo os argumentos de Ana Sá Lopes, mas também aqui estou em desacordo, uma vez que a administração Obama foi, ainda, em tempo recente, e isso pode ser aproveitado por Trump. Além do mais, Michelle tem capital político e intelectual para surgir, numa futura eleição, como candidata presidencial, pelo que nesta fase estaria a esgotar tais recursos. Melhor seria um endorsement without commitment.